Rei D. José I |
Marquês
de Pombal, nome pelo qual ficou conhecido o primeiro-ministro do rei D. José I,
nasceu a 13 de Maio de 1699, em Soire, no seio da pequena nobreza, filho de
Manuel de Carvalho e Ataíde e de Teresa Luísa de Mendonça e Melo. Tinha doze
irmãos dos quais haviam dois a quem era muito ligado: Francisco Xavier de
Mendonça (1700-1779) e Paulo de Carvalho e Mendonça (1702-1770).
Após a morte de seu pai, com cerca de 20 anos, Sebastião
José decidiu frequentar a Universidade de Coimbra, onde se formou em Direito.
Em 1723, contraiu matrimónio com D. Teresa de Noronha e Bourbon de Mendonça e
Almada e, uma década depois, em 1733, integrou a Real Academia da História. Foi
embaixador do rei Magnânimo em Londres de 1739 a 1743, e em Viena de 1745 a
1749. Em 1745, após a morte de Teresa, casou com D. Maria Leonor Ernestina de
Daun, em segundas núpcias, o que lhe permitiu a descendência desejada que não
conseguiu com a sua primeira mulher (cinco filhos). Para além disso, Sebastião
conseguiu entrar na nobreza austríaca e conhecer um novo mundo político, onde
«bebeu os grandes princípios do Despotismo Iluminado que haveria de aplicar no
seu regresso ao País». Ou seja, ambicionou fazer em Portugal o que tinha visto
no estrangeiro, nomeadamente na Inglaterra.
Foi na sequência do Terramoto de 1755, Sebastião
José de Carvalho e Melo teve a oportunidade de mostrar a sua capacidade de
liderança e raciocínio, o que não passou despercebido ao monarca português,
acentuando o poder do seu ministro.[8] Um
ano depois, Sebastião deixou a Secretaria dos Negócios Estrangeiros e da Guerra
e ocupou a Secretaria do Reino.
Entre outras medidas, Sebastião José colocou pessoas
à disposição para mover destroços das ruas, distribuiu mantimentos pelos
bairros de Lisboa, determinou o regresso
dos moradores às suas funções para abastecer a cidade e puniu aqueles que se
aproveitaram da desgraça para roubar bens das igrejas e das casas.
«Os efeitos
sobre o património edificado foram devastadores, afirmando-se pouco depois da
ocorrência que mais de dois terços da cidade se encontravam inabitáveis. A
esmagadora maioria das cerca de quatro dezenas de igrejas paroquiais da cidade
ficou destruída ou em risco de ruína. Todos os grandes hospitais soçobraram.
Destruídos ficaram a maioria dos edifícios da administração central e das
alfândegas (…) as edificações mais emblemáticas de D. João V e de D. José na
cidade (…) Fala-se na destruição de trinta e três palácios (…) o mesmo destino
tiveram cerca de dois terços dos mosteiros da capital. Pode estimar-se que
também tinha sido destruído o recheio da maioria dos grandes edifícios reais,
eclesiásticos e nobiliárquicos (…) pinturas, mobiliário, livrarias e peças em
ouro e prata».[9]
Cartaz publicitário da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro |
«Viva el-Rei de
Portugal
E viva o nosso
chanceler:
Porém não a
Companhia
Porque o povo
não a quer!»[11]
Em
Setembro de 1758, o monarca foi alvo de um atentado quando regressava ao
palácio de um encontro na casa da sua amante D. Teresa de Távora e Lorena, a
marquesa de Távora, esposa de Luís Bernardo de Távora. Começava aqui o processo
dos Távoras. [12]
D.
José herdou do seu pai D. João V a fogosidade, mas procurou sempre uma
ponderada e reservada vida amorosa, excepto com esta dama da corte. D. Mariana
Vitória não escondia o seu sentimento de resignação face aos rumores[13].
Este
atentado tinha como objectivo substituir o rei D. José I pela sua filha D. Maria
e serviu como pretexto a Pombal para uma enorme repressão contra as grandes
casas nobres de Portugal. As investigações sobre a tentativa de homicídio ao
monarca duraram meses e prevaleceu em sigilo até serem indiciados os duques de
Aveiro, o conde de Atouguia, alguns elementos da família Távora (destacando-se
a marquesa de Távora, como principal instigadora junto da restante família
Távora) e outras figuras de destaque da nobreza portuguesa. Estes foram
culpados pelo crime “Leza Magestade” e condenados à pena máxima – a morte. A
marquesa de Távora foi degolada sem ser ouvida e os restantes elementos
condenados foram mortos de forma dantesca. Demorou dez horas este espectáculo
horrível, que terminou com uma fogueira imensa.
Desenho do atentado de D. José I |
Patíbulo de Belém com a execução dos Távora e Aveiro |
O
despótico marquês de Pombal soube aproveitar o atentado ao monarca português
para expulsar os Jesuítas do país[14],
nomeadamente figuras como Padre Gabriel Malagrida, João de Matos e João
Alexandre. Talvez estes não tivessem uma acção directa no atentado, mas «está
fora de dúvida a sua acção em criar uma atmosfera geral de medo e de ódio
contra o poderoso primeiro-ministro até ao ponto de interpretar o terramoto
como castigo de Deus pelos seus crimes».[15]
«Declaro
os sobreditos regulares na referida forma corrompidos, deploravelmente
alienados do seu santo instituto, e manifestamente indispostos com tantos, tão
abomináveis, tão inveterados e tão incorrigiveis vícios para voltarem à
observância dele, por notórios rebeldes, traidores, adversários e agressores
que têm sido e são actualmente contra a minha real pessoa e estados, contra a
paz pública dos meus reinos e domínios, e contra o bem comum dos meus fiéis
vassalos, ordenando que como tais sejam tidos, havidos e reputados, e os hei,
desde logo, em efeito desta presente lei, por desnaturalizados, proscritos e
exterminados, mandando que efectivamente sejam expulsos de todos os meus reinos
e domínios para neles mais não poderem entrar».[16]
Foi
na década de 60 que Pombal se notabilizou pelas suas reformas; no ensino, criou
do Real Colégio dos Nobres, em 1761, a Junta da Previdência Literária, em 1768,
e o Subsídio Literário, em 1772; no sector financeiro, concebeu o Erário Régio,
em 1761[17];
e no sector judicial, criou a Intendência-Geral da Polícia. Nestes últimos
sectores, o objectivo era controlar o sistema através de um organismo centralizado.
Para acabar com a influência do clero criou, em 1768, a Real Mesa Censória,
atribuindo ao Estado o controlo do Tribunal do Santo Ofício[18].
Na
política externa, Portugal tentou a neutralidade face à Guerra dos Sete Anos, entre
a França e a Inglaterra, mas, perante a recusa de Portugal em prestar auxílio à
França (Pacto de Família), as tropas espanholas e francesas invadiram o
território português pela fronteira de Trás-os-Montes, em 1762.
Para retaliar a
invasão, marquês de Pombal contratou o conde Wilhelm von Schaumburg-Lippe (Conde
de Lipe) para comandar as tropas portuguesas e recebeu a ajuda inglesa e suíça.
Assim, «os Portugueses conseguiram resistir no Norte e obrigar os invasores à
retirada. Na Beira e no Alentejo, novas invasões conduziram a idêntico
resultado». A paz veio um ano depois com o Tratado de Paris.
O
rei Reformador, que viveu na sombra de Pombal, morreu dia 24 de Fevereiro de
1777, em Lisboa, vítima de uma apoplexia, estando sepultado na igreja de São
Vicente de Fora. No seu reinado foi abolida a escravatura e tomaram-se medidas
para acabar com o tráfico de escravos. Todavia, é facilmente um reinado
associado ao seu secretário de Estado, um homem bastante activo na área
política, do que a D. José, que privilegiava os entretenimentos, como a caça e
a ópera[19].
D. Maria I |
Após
a morte do monarca, Marquês de Pombal foi demitido a 4 de Março de 1777 por
decreto-régio[20].
Dois anos depois, foi acusado de corrupção e abuso de poder, sendo condenado ao
desterro, em 1781. Morreu um ano depois, «em Pombal, fosse de pedra biliar,
fosse de edema dos pulmões, ou da simples nostalgia em que a corrupção física
se baseia.»[21]
Após
a morte de D. José I, seguiu-se D. Maria I, a Piedosa, no trono português. Apregoou
a Viradeira, um movimento para pôr foi o fim do Pombalismo e afastou Marquês de
Pombal da corte portuguesa. Com a sua morte pouco tempo depois do seu desterro,
encerrou-se um capítulo da História de Portugal, mas o povo jamais esqueceu a
tragédia dos Távoras.
[1] D. João V, cognominado o
Magnânimo, nasceu a 22 de Outubro de 1689, em Lisboa, filho de de D. Pedro II e
de D. Maria Sofia de Neuburgo. Subiu ao trono em 1706, após a morte de seu pai
a 9 de Dezembro do mesmo ano, em Lisboa. Casou com D. Maria Ana de Áustria, a 9
de Julho de 1708, com quem teve seis filhos, entre eles D. José (futuro D. José
I). Faleceu a 31 de Julho de 1750.
[2] Os jesuítas, no reinado de D.
João V e depois de D. José I, detiveram, até à sua expulsão do país, um papel
importante nos bastidores da corte. A rainha D. Mariana Vitória possuía um
confessor jesuíta, assim como o seu esposo, o monarca D. José.
[3] Com a morte de Manuel Pimentel
em 1719, Manuel da Maia assume o seu lugar na educação do jovem príncipe. Este
terá um papel de destaque após o terramoto de 1755 na reconstrução da cidade de
Lisboa.
[4] Filha de Filipe V e de Isabel de
Farnésio, D. Mariana Vitória nasceu a 31 de Março de 1718, em Madrid, e faleceu
a 15 de Janeiro de 1871, em Lisboa.
[5] A futura D. Maria I nasceu a 17
de Dezembro de 1734, em Lisboa, e foi a primeira rainha reinante de Portugal,
após a morte de seu pai, D. José, a 24 de Fevereiro de 1777. Contraiu
matrimónio com o seu tio D. Pedro em 1760, de quem enviuvou muito cedo. Durante
o seu reinado tentou emendar os erros de seu pai, acabando com o despotismo
pombalino e repondo a inocência à família Távora (Viradeira). Infelizmente, sucessivos
acontecimentos trágicos abalaram a sua saúde mental, levando o seu filho, o
futuro D. João VI, assumir a regência do reino em 1799. Faleceu no Rio de
Janeiro (Brasil), a 20 de Março de 1816, com 82 anos, após ter embarcado com
toda a família real para a colónia brasileira, em Novembro de 1807, na
sequência das invasões napoleónicas.
[6] «Até ao fim do seu governo,
Pombal continuou a perseguir os nobres, o clero e quaisquer outros que ousassem
combater a sua política despótica» in
OLIVEIRA MARQUES, A.H, História de
Portugal – Desde os tempos mais antigos até ao governo do Sr. Pinheiro de
Azevedo, Palas Editores, Lisboa, 1977, p. 572
[7] SARAIVA, José Hermano, História concisa de Portugal, 25ª
edição, Publicações Europa-América, Lisboa, 2011, p. 241
[8] «A história faz-lhe inteira
justiça quanto às providências de governo que, postas em imediata execução,
levaram a reconstruir Lisboa e a atender as carências e dores da atingida
população» in SERRÃO, Joaquim
Veríssimo, História de Portugal – O
Despotismo Iluminado (1750-1807), volume VI, Editorial Verbo, Lisboa, 1980,
p. 28
[10] «Sendo o
principal o objectivo desta Companhia sustentar a reputação dos vinhos, a
cultura das vinhas, e beneficiar ao mesmo tempo o comercio que se faz neste
genero, estabelecendo para ellle um preço regular, e que resulte competente
conveniência aos que fabricão, e respectivo lucro aos que nelle negocêão,
evitando por uma parte os preços excessivos, que, impossibilitando o consumo,
arruinão o genero; evitando pela outra parte que este se abata com tanta
decadencia, que aos lavradoures não possa fazer conta sustentarem as despesas
annuaes da sua agricultura». in
ARAÚJO, Francisco Zacharias de, Vinhas do
Alto Douro, Impresso por L. Thompson na Officina Portugueza, Londres, 1826,
pp. 40-41
[12] Leonor de Almeida de Portugal
Lorena e Lencastre, filha do 2º marquês de Alorna, e neta dos marqueses de
Távora, foi enclausurada aos 8 anos no mosteiro de Chelas até 1777, ano do
afastamento de Marquês de Pombal na sequência da morte do rei D. José I.
Permaneceu encerrada com a sua mãe e irmã durante dezanove anos e, após a sua
soltura, casou com com o conde Carlos Augusto de Oeynhausen. Foi na sequência
deste casamento que contactou com as cortes europeias. Em 1813, recolheu-se
definitivamente no seu país, onde veio a falecer a 11 de Outubro de 1839.
[13] «É verdade que o rei monta bem;
mas creia que monta ainda melhor quando está com vossa filha» in LOURENÇO, Paula, PEREIRA, Ana
Cristina e TRONI, Joana, Amantes dos reis
de Portugal, 8ª edição, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2011, p. 201
[14] Sebastião José
de Carvalho ficou co uma impressão negativa face aos Jesuítas devido às cartas
enviadas pelo seu irmão Francisco Xavier de Mendonça Furtado do Brasil: «Quero
ultimamente acabar de discorrer e tomar o tempo de V. Exa. Com este cansado,
absoluto e prejudicialíssimo poder dos Regulares, porque, sendo ele sem dúvida
a total ruína deste Estao, e o que há de obstar ao progresso de quantos
estabelecimentos nele se quiserem fazer […]» in MONTEIRO, Nuno Gonçalo, D.
José – Na sombra de Pombal, Círculo de Leitores, Lisboa, 2006, p. 77
[15] OLIVEIRA MARQUES, A.H, História de Portugal – Desde os tempos mais
antigos até ao governo do Sr. Pinheiro de Azevedo, Palas Editores, Lisboa,
1977, p. 571
[16] SILVA, António Delgado da, Collecção da Legislação Portugueza,
Typografia Maigrense, Lisboa, 1830, pp. 714-715
[17] «Dom José […] Faço saber aos que
esta Minha Carta de Lei virem, que tendo o estabelecimento, conservação, e
aumento das Monarquias[…] huma essencial, e indispensável dependência da
regular e exacta arrecadação das Rendas que constituem o Erário Público; porque
sem se fazer efectiva, e prompta a entrada das sobreditas rendas, para serem
com o mesmo efeito, e promptidão [remetidas] às respectivas destinações; nem a
Authoridade Régia se pode sustentar com esplendor, que he inseparavel da
Magestade; nem os Ministros que compõem os Tribunais, Auditorias de Graça, e
Justiça, podem manter decorosamente a dignidade […] nem os Militares que
constituem a força, e o respeito dos soberanos, e a segurança dos Povos se
podem conservar;» in Dom José por
graças de Deos Rey de Portugal… Faço saber aos que esta minha carta de ley
viram, que tendo o estabelecimento, conservação e augmento das monarchias.
1761, Lisboa, Chancellaria Mór da Corte e Reino
[18] «Dom José […] Faço saber, que no
meu Tribunal Real Mesa Censoria foi denunciado hum livro intitulado Memoire sur les libertés de l’ Eglise
Gallicane, que se diz impresso em Amesterdam na Officina Arkstée, e Merkus
no anno de 1755 em hum Tomo de oitavo: Mostrando-se que este livro he hum
daqueles , que impoe com o titulo;» in
Dom José por graça de Deos Rei de Portugal,
… Faço saber que no meu Tribunal da Real Meza Censoria foi denunciado hum livro
intitulado Memoire sur les libertés de l’Eglise Gallicane, 1769, Lisboa,
s.l.
[19] «Para a historiografia musical
portuguesa, o reinado de D. José I tem sido tradicionalmente sinónimo do
florescimento da ópera em Portugal como instrumento de propaganda do poder
régio, em correlação com o processo de secularização da vida política e cultural,
por oposição ao reinado de D. João V, que centrou a sua política musical no
cerimonial religioso.» in FERNANDES,
Cristina, «A música sacra no período pombalino», Revista Camões, nº15/16, 2003, p. 87
[20] Marquês de Pombal não gostava da
futura rainha D. Maria I, nem do seu marido, Pedro de Bragança (uma personagem
de destaque na Nobreza portuguesa), logo não seria de esperar outro desfecho
senão a sua saída do poder.
[21] BESSA-LUÍS, Agustina, «Memórias
Pombalinas do marquês de Bombelles», Revista
de Camões, nº 15/16, 2003, p. 6
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